Sobre a língua portuguesa...
Voltou à blogosfera um novo debate sobre a língua portuguesa. O Pedro no seu blog, O céu sobre Lisboa, apresenta-nos um texto interessante e provocador, mas menos exacto, ou melhor, mais confuso do que os posts que dedicou à "orthographya" (de I a V) – diálogo interessante que manteve com o Aviz. O que me levou a escrever foi, no entanto, este seu último texto.
Começa por dizer que a aprendizagem da língua na infância é um processo inato. Até aqui tudo bem. As confusões começam quando fala da liberdade poética de Sena, como exemplo de que certas subversões à gramática normativa continuam a ser português. Obviamente que são português, tal como os poemas de e.e. cummings são inglês. Contudo, nenhum inglês escreveria num jornal, relatório ou outro tipo de texto, como cummings. Existe, desde logo, para um leitor de um texto poético uma atenção para estas subversões como artefactos próprios da expressão poética, seja sob a forma de prosa ou de verso.
Depois, afirmar que ninguém fala mal a respectiva língua materna é perigoso e falacioso. Se, por um lado, as gramáticas normativas têm artigos ambíguos, por outro lado, a correcta conjugação dos verbos, a acertada concordância em género e número são aspectos normativos necessários, e nem todos os falantes dominam estes aspectos.
Depois, a maneira de falar da capital, a que se refere é o dialecto padrão de um país, tal como o RP o é para o caso inglês. E padrão não é norma; é o modelo que deve ser seguido, pois se todos os falantes portugueses seguissem o seu dialecto regional provalmente não nos entenderíamos (especialmente no que se refere às expressões idiossincráticas de cada dialecto).
Quando diz: (...) Mas as línguas mudam, evoluem, e evoluem através da 'asneirada', daquilo que infringe a norma, uma vez que qualquer inovação na gramática é sempre sentida como uma asneira, nunca como um aperfeiçoamento. Trata-se apenas de uma meia verdade: as línguas evoluem e o que hoje pode ser considerado um erro, amanhã poderá estar consagrado numa qualquer gramática normativa. Mas as inovações que tanto advoga devem ser maturadas e só depois se deve decidir se realmente são necessárias e úteis à nossa língua. Aliás, as gramáticas descritivas existentes servem esse mesmo fim. Agora afirmar-se que a repetição constante de um erro por muitos falantes se deve adoptar automaticamente (pois a norma foi inventada por classes educadas e elitistas e que só serve para dar trabalho a revisores e editores de texto...) é uma emenda muito pior do que o soneto.
Por fim, quando afirma:
A pseudo-linguística confunde norma culta com gramática e está para a linguística assim como os manuais de boas maneiras estão para a sociologia. (...) Os burocratas da língua preferem perder tempo com considerações apocalípticas e hipocondríacas sobre uma imaginária decadência do português e insistir em corrigir 'erros' que muitas vezes não o são.
Não sei a que linguística se está a referir, existem várias correntes. Julgo que se reporte aos gramáticos normativos. Também eu sou contra os fundamentalistas da norma e os puristas da língua. Concordo absolutamente que poucos falem de estilo, de como escrever da maneira mais económica, mais expressiva ou mais fácil de ler (aliás, defendo mesmo a existência de cadeiras de Retórica nos cursos de Letras), mas os anarquistas da língua, que tudo aceitam, que com todos os erros são coniventes, mesmo os mais graves, preocupam-me muito mais do que estes últimos e só espero que o Pedro não faça parte deste "pseudo-libertadores das garras da norma", que mais não são do que meros desculpabilizadores do erro.
P.S – Aos meus leitores habituais as minhas desculpas pelo comprimento do texto. Ao Pedro, se me chegar a ler, as minhas desculpas por não responder sob a forma de "comentário longo"...
Começa por dizer que a aprendizagem da língua na infância é um processo inato. Até aqui tudo bem. As confusões começam quando fala da liberdade poética de Sena, como exemplo de que certas subversões à gramática normativa continuam a ser português. Obviamente que são português, tal como os poemas de e.e. cummings são inglês. Contudo, nenhum inglês escreveria num jornal, relatório ou outro tipo de texto, como cummings. Existe, desde logo, para um leitor de um texto poético uma atenção para estas subversões como artefactos próprios da expressão poética, seja sob a forma de prosa ou de verso.
Depois, afirmar que ninguém fala mal a respectiva língua materna é perigoso e falacioso. Se, por um lado, as gramáticas normativas têm artigos ambíguos, por outro lado, a correcta conjugação dos verbos, a acertada concordância em género e número são aspectos normativos necessários, e nem todos os falantes dominam estes aspectos.
Depois, a maneira de falar da capital, a que se refere é o dialecto padrão de um país, tal como o RP o é para o caso inglês. E padrão não é norma; é o modelo que deve ser seguido, pois se todos os falantes portugueses seguissem o seu dialecto regional provalmente não nos entenderíamos (especialmente no que se refere às expressões idiossincráticas de cada dialecto).
Quando diz: (...) Mas as línguas mudam, evoluem, e evoluem através da 'asneirada', daquilo que infringe a norma, uma vez que qualquer inovação na gramática é sempre sentida como uma asneira, nunca como um aperfeiçoamento. Trata-se apenas de uma meia verdade: as línguas evoluem e o que hoje pode ser considerado um erro, amanhã poderá estar consagrado numa qualquer gramática normativa. Mas as inovações que tanto advoga devem ser maturadas e só depois se deve decidir se realmente são necessárias e úteis à nossa língua. Aliás, as gramáticas descritivas existentes servem esse mesmo fim. Agora afirmar-se que a repetição constante de um erro por muitos falantes se deve adoptar automaticamente (pois a norma foi inventada por classes educadas e elitistas e que só serve para dar trabalho a revisores e editores de texto...) é uma emenda muito pior do que o soneto.
Por fim, quando afirma:
A pseudo-linguística confunde norma culta com gramática e está para a linguística assim como os manuais de boas maneiras estão para a sociologia. (...) Os burocratas da língua preferem perder tempo com considerações apocalípticas e hipocondríacas sobre uma imaginária decadência do português e insistir em corrigir 'erros' que muitas vezes não o são.
Não sei a que linguística se está a referir, existem várias correntes. Julgo que se reporte aos gramáticos normativos. Também eu sou contra os fundamentalistas da norma e os puristas da língua. Concordo absolutamente que poucos falem de estilo, de como escrever da maneira mais económica, mais expressiva ou mais fácil de ler (aliás, defendo mesmo a existência de cadeiras de Retórica nos cursos de Letras), mas os anarquistas da língua, que tudo aceitam, que com todos os erros são coniventes, mesmo os mais graves, preocupam-me muito mais do que estes últimos e só espero que o Pedro não faça parte deste "pseudo-libertadores das garras da norma", que mais não são do que meros desculpabilizadores do erro.
P.S – Aos meus leitores habituais as minhas desculpas pelo comprimento do texto. Ao Pedro, se me chegar a ler, as minhas desculpas por não responder sob a forma de "comentário longo"...
1 Comments:
Pus no meu blogue um comentário ao seu comentário. Agradeço o seu interesse.
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Unknown, at 7:19 da tarde
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